Azul da Prússia – a ditadura nos palcos
Brasília, janeiro de 2017 – Inspirado pelo momento de crise política e de representação no país, o ator e diretor Alexandre Ribondi abre a temporada 2017, no Teatro Brasília Shopping, com o espetáculo Azul da Prússia. A peça estará em cartaz nos dois últimos finais de semana de janeiro, dos dias 20 a 29, de sexta a domingo, sempre às 20h.
Segundo Ribondi, a peça apresenta um encontro improvável entre um morador de rua e um jovem perdido na noite da capital federal. O diálogo que segue é surpreendente e revelador. De forma lírica, bem-humorada e distante do discurso panfletário, traz memórias da ditadura militar. “Como estamos vivendo momentos de muita incerteza no país – política e econômica – é importante voltar a falar dos anos 60 e 70 na história brasileira”.
No espetáculo, uma das personagens lê um diário onde há passagens do dia-a-dia na ditadura. Além de autor, Ribondi dirige a peça e interpreta a personagem do morador de rua, dividindo o palco com Matheus Silva, ator da nova cena de Brasília.
“Quase ninguém para pra pensar, mas o mais atroz da ditadura é o dia a dia. É cada dia. Cada olhar de rabo de olho na rua, cada carro de polícia que passa. Isso é muito difícil”, conta o autor.
O título da peça, Azul da Prússia, é sobre uma tonalidade de azul inexistente na natureza, criada em laboratório, e cuja produção envolve elementos altamente tóxicos. Dentre eles está o ácido cianídrico, ou ácido prússico, descoberto pelo cientista sueco Carl Wilhelm Scheele em 1782, a partir da decomposição da própria cor. Este elemento foi usado como arma química na 1ª Guerra Mundial e nas câmaras de gás dos campos de concentração nazistas durante a 2ª Guerra Mundial. “Aqui eu uso a cor para falar dos lábios de pessoas mortas”, detalha Ribondi.
Apesar da densidade do tema a peça é envolta em lirismo e humor. O autor lembra que o tema precisa ser recriado para que não seja esquecido, já que muitas pessoas que viveram durante o período ditatorial ainda estão vivas. Na peça, o personagem interpretador por Ribondi retrata a um rapaz mais novo o drama vivido coletivamente pelo país no tempo da ditadura. “ Na vida, a gente ri e chora, e às vezes fazemos isso todos os dias. O drama pode provocar risos, o risível pode nos levar às lágrimas. Azul da Prússia é assim mesmo, feito a vida. Trata de um tema espinhoso, triste, medonho, mas podemos rir estando dentro da violência”. A ideia é mostrar o que aconteceu com sua vida e sua alma depois de ter vivido uma ditadura.
Três perguntas para Alexandre Ribondi:
1. Como foi o processo de criação do espetáculo?
Eu comecei pensando em escrever alguma coisa que refletisse os tempos em que vivemos e que mostrasse esse eterno ciclo. Em seguida, convidei um jovem, Matheus Silva, para o processo e começamos a elaborar as personagens, que são muito diferentes e que se encontram de maneira improvável. Temos tido muitos ensaios, pela complexidade do tema.
2. Como é trabalhar, na mesma peça, como ator, diretor e autor? O que muda no trabalho?
Muda tudo. Em primeiro lugar, é cansativo, porque você tem que se ocupar de você mesmo no palco e com o parceiro de cena. torna-se assim um trabalho mais cuidadoso, em que você tem que pensar em você e no outro, o tempo todo – deveria ser assim na vida também. Mas conto com a ajuda preciosa da assistente de direção, que é a Elisa Mattos – que acumula funções. Ela é a produtora do espetáculo.
3. Qual a importância de ainda trabalhar nos palcos o tema da ditadura? É possível que ainda se desprendam novos olhares e perspectivas desse tema?
Foi esse o motivo que me fez escrever, dirigir e atuar em Azul da Prússia: a ditadura. Não se pode esquecer a história, não se pode esquecer que as pessoas que passaram por esse período ainda estão vivas e guardam lembranças. Além disso, sabemos que há forças no Brasil, hoje, que querem a volta de uma ditadura. E isso tem que ser discutido e avaliado. Acredito no sonho de um país melhor, porque sei que os maus governantes têm que ser apontados. Sei que uma ditadura cria marcas e manchas na alma que são difíceis de ser limpadas. Ficam por muito tempo.
Serviço
Azul da Prússia
Local: Teatro do Brasília Shopping
Data e hora: 20 a 29 de janeiro de 2017 (sextas, sábados e domingos, sempre às 20h)
Ingressos: R$40 (inteira), R$20 (meia)
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