Morra, amor, Ariana Harwicz
Eu gosto bastante de leituras que me incomodam e me mexem por dentro de alguma forma. E foi assim com o livro Morra amor, da argentina Ariana Harwicz. Foi uma das melhoras leituras desse primeiro semestre, me causando estranhamento e me deixando presa às páginas ao mesmo tempo. ⠀
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A narrativa aparece toda como num fluxo de consciência extremamente pessoal, cru e carnívoro, nos mergulhando na experiência cotidiana da personagem.⠀
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Aliás, a personagem também não é das mais comuns: uma mulher que voltou recentemente da maternidade e transita pela vivência conturbada de uma mulher que parece não amar seu filho, enquanto nutre uma espécie de nojo e repulsa pelo marido. ⠀
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Este, aliás, parece aceitar passivamente as transformações psicológicas e respostas pouco convencionais da esposa, o que torna tudo ainda mais incômodo.⠀
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A consciência é mostrada sem filtro entre as páginas, desenhando o olhar angustiante de uma mulher que se vê presa a um espaço que não sabe, não quer e não entende mais como ocupar. A linguagem é bem direta, tornando o relato ainda mais impactante. ⠀
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Ariana foi desenhando em mim uma angústia para encontrar uma saída, uma janela em meio àquele espaço, uma tábua de salvação, enquanto sua personagem se adensava cada vez mais, com vísceras expostas.⠀
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O título da obra e a capa fazem jus à obra, que retrata muito bem essa crueza um tanto desesperadora de não saber responder mais aos próprios sentimentos. Quem sabe exista um pouco de loucura e pensamentos perversos em cada um de nós. ⠀
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Em Morra, amor, entramos sem convite numa imersão perturbadora e um tanto cotidiana de um conjunto desses retratos e vozes que ocupam a mente. Alguns deles escapam ao mundo externo. Outros, permanecem bem guardados enquanto o corpo caminha do lado de fora como se perdesse o equilíbrio. ⠀
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Era assim que eu visualizava a personagem, num andar meio torto e os olhos vidrados demais.⠀
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O livro foi publicado em 2012 e é a primeira parte de uma trilogia “involuntária”, chamada por Harwicz de “trilogia da paixão”, tendo em vista que os três livros exploram a relação entre mães e filhos. Dela também fazem parte os romances A débil menta, de 2015, e Precoce, de 2016.⠀
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